domingo, 29 de maio de 2011

A OBESIDADE É UMA ENFERMIDADE GENÉTICA?

   



”Mesmo sendo um mal comum a muitas pessoas, a obesidade ainda não é totalmente conhecida pelos médicos. E, um dos pontos que mais dúvidas levanta é o que trata de sua causa. Pesquisas recentes, porém dão como certa  a influência significativa da herança genética no desenvolvimento do problema.”
A obesidade constitui hoje uma das desordens nutricionais mais comuns dos países desenvolvidos e em desenvolvimento, gerando um verdadeiro problema público. A facilidade de acesso a alimentos industrializados e a diminuição da atividade física, ambos conseqüência do progesso, aparecem como principais responsáveis da alarmante alta de casos, que em alguns países alcança mais de 30%  da população adulta, e perigosamente, já está afetando também a população infantil.
Isto em levado numerosos laboratórios de investigação a intensificar seus esforços para compreender as bases fisiopatolígicas da obesidade. Sendo assim, está mais fácil descobrir remédios mais eficientes e com menos resultados adversos do que os causados pelos medicamentos utilizados atualmente. As novas fórmulas devem complementar da melhor maneira o tratamento tradicional, constituída de regime hipocalórico, atividade física e mudança de conduta.





A obesidade pode ser definida como uma enfermidade crônica, de origem multifatorial, na qual fatores genéticos e ambientais se interagem. É caracterizada por um aumento anormal do tecido gorduroso, que provoca riscos para a saúde.
São numerosos os estudos epidemiológicos que avaliam o risco de mortalidade apresentado pelos obesos, especialmente no que se refere a patologias crônicas que repercutem no sistema cardiovascular – hipertensão arterial, diabetes mellitus não insulino dependente e dislipidemias, entre outras. É necessário o reconhecimento preventivo desses problemas, para que o tratamento adequado seja realizado o quanto antes. Infelizmente, mesmo com prosseguimento do regime hipocalórico, da atividade física, das mudanças de conduta e do uso de medicamentos anorexígenos, após a diminuição de peso é difícil conseguir mantê-lo.
É essa aparente resistência à baixa de peso e rápida recuperação do peso corporal inicial, que leva a pensar na contribuição, em maior ou menor grau, dos fatores genéticos, o que está sendo confirmado por algumas observações que precisam ser decifradas:
a)  A maior freqüência de obesos dentro de uma mesma família:
Quando um dos pais é obeso a probabilidade do filho também ser obeso é de aproximadamente 40%, aumentando para 80% quando ambos os progenitores o são.
b)  A maior semelhança entre os pesos corporais de filhos adotados com seus pais biológicos do que com seus pais adotivos.
c)   A relação de peso mais próxima entre gêmeos monozigotos do que no dizigotos.
d)  A aparição constante da obesidade em enfermidades genéticas humanas raras, determinadas pela mutação de um só gen.

Os mecanismos exatos de como os fatores genéticos influem na obesidade, ainda estão pouco claros. Entretanto, não há dúvida de que eles afetam tanto o ingresso calórico como o gasto energético no metabolismo.




         O GENE DA OBESIDADE 

              




A  partir do final de 94, uma série de trabalhos realizados nos Estados Unidos, resultam na clonagem, primeiramente em ratos e humanos, do denominado “gene da obesidade”. Ele manifesta-se exclusivamente no adipócito, por meio da síntese de uma proteína denominada leptina ou proteína OB, cujas principais funções conhecidas até agora são participar ativamente na saciedade e informar o hipotálamo – lugar do cérebro onde se encontram os centros que regulam o apetite e a saciedade -  sobre nossas reservas de gordura periféricas, além de aumentar o gasto energético e a mobilidade. Esta proteína é uma das responsáveis pela manutenção do peso corporal, apesar das grandes variações na alimentação, processo denominado set point.
Os níveis plasmáticos de leptina, em geral, guardam uma estreita relação com a quantidade de gordura, pois diminuem notoriamente com a baixa de peso e elevam-se com o aumento deste, podendo ser, em parte, responsáveis pela recuperação do peso, ao aumentar o apetite e diminuir o gasto energético.
Estudos realizados em obesos, permitem concluir que a grande maioria têm os níveis de leptina altos. Em alguns casos, porém podem aparecer níveis normais, ou até mesmo diminuídos.
Experiências feitas em ratos geneticamente obesos apresentaram uma redução siginificativa do peso corporal, ao ser administrada a proteína leptina, o que demonstra a existência de uma deficiência da substância. Outros tipos de animais obesos são resistentes a ela, aparentemente por um defeito em seu receptor hipotalâmico.
Essa experiência poderia estender-se a humanos, sem obstáculos, no gen OB codificador da leptina. Os estudos de sua ação em pessoas obesas já estão sendo realizados.
Por outro lado, tem sido detectada a diminuição de outros importantes sinais hormonais de saciedade, originados no tubo intestinal, com a chegada dos alimentos.
Eles informariam aos centros reguladores da alimentação que devemos deixar de comer, e podem ter base genéticas, o que demostra a participação poligênica na etiologia da obesidade. Além disso, estudos em animais e humanos obesos demostram alterações nos neurotransmissores – substâncias químicas que comunicam um neurônio a outro – implicadas na alimentação. Isso ocasionaria  uma hiperfagia, e, em conseqüência a obesidade. Um exemplo clássico dessas reações são vistas na serotonina.
Até aqui só nos referimos à participação genética que repercute na ingestão de calorias. Contudo, também são detectadas alterações calóricas, que contribuem para uma liberação energética mais eficiente, pondo fim ao aumento do tecido gorduroso.
Pesquisas indicam que pode haver diminuição do gasto energético e daí, liberação energética em qualquer dos três componentes – metabolismo basal,  termogênese induzida pela dieta e atividade física. Mas nem todos  são convincentes, o que poderia explicar-se  pela heterogeneidade das obesidades e diferenças na terapias empregadas.



Nos últimos tempos estão sendo identificados em animais e hunanos mutações em certos genes relacionados  aos ingressos calóricos , especificamente com a termogênese induzida pela dieta, com seus dois componentes – obrigatórios e facultativo. Para compreender este último  item, é necessário conhecer  certos conceitos relativos a termogênese.
Trata-se do processo pelo qual os animais homeotermos são capazes de produzir calor, o que lhes permite manter ser corpo a temperaturas próximas aos 37 º C, independente – até certo ponto – das temperaturas externas. A transformação da energia metabolizável obtida  através dos alimentos, produzem perdas inevitáveis  de energia em forma de calor, somadas ao gasto energético obrigatório ocupado na assimilação  dos nutrientes – digestão, absorção, transporte e armazenamento. Ela é chamada termogênese obrigatória e a utilizamos para a manutenção do organismo, trabalho externo, crescimento e reprodução. Sem dúvidas, existe outra forma de produzir calor por parte do corpo, em resposta a diversos estímulos , como alimentação extra, exposição ao frio e remédios, conhecida como termogênese adaptativa.
É interessante observar como corpo mantém o peso dentro de  margens limitadas, apesar da alimentação cheia de excessos a que podemos estar  expostos.
Muito tem-se especulado em relação ao órgão que realiza esta importante função que é dissipar o excesso de calorias consumidas diariamente em forma de calor. Mas, de acordo com estudos atuais, seria especialmente o tecido adiposo (branco e pardo), os músculos e o fígado, entre outros.
Neles foram detectadas anomalias genéticas – Proteína Desacoplante 1 e 2  mitocondrial  (UPC) e Beta 3 adrenoreceptores  - que poderiam impedir o desenvolvimento das funções, com uma liberação energética substancial que poderia lebar com o tempo, à obesidade.
Por outro lado, a atenção dos investigadores também está centrada no fenômeno do manejo dos nutrientes. Isso se relaciona  com a forma do organismo utilizar os carboidratos – açucares – e gorduras, seja metabolizando-os como energia ou armazenando-os.



Como sabemos, nosso organismo possui uma capacidade limitada de armazenar carboidratos como glucogeno no fígado e músculos. Sendo assim, o excesso deles poderia ser identificado como gordura. Caso, contrário, o corpo tem uma extrema facilidade para armazenar gordura, em quantidades quase ilimitadas, provavelmente refletindo um mecanismo de proteção para os dias em que a pessoa não alimentar-se bem.
Acredita-se que certos indivíduos teriam maior capacidade de utilizar os carboidratos como fonte energética, num processo de oxidação. Neste caso, seria facilitado no adipócito, mediante a participação da enzima lipoproteinlipasa (LPL), cuja atividade também estaria determinada geneticamente. Nas pessoas obesas seria apresentada uma superatividade dessa enzima.
Poe último, também é interessante assinalar que a herança genética tem um papel importante na distribuição da gordura corporal, guardando relação com um risco maior de mortalidade. Isto é certo para a obesidade de tipo andróide (mais comum na mulher após a menopausa e no homem), na qual a gordura situa-se preferencialmente na metade superior do corpo, tórax e abdômen, e que é identificada como a obesidade em forma de maçã. Por sua vez, a gordura que se distribui na metade inferior do corpo, fêmur e glúteos, conhecida como pêra, é própria da obesidade ginóide, e está presente na mulher em idade reprodutiva. Ela apresenta riscos muito menores de complicações metabólicas.
Todo o exposto anteriormente, nos leva a observar a obesidade de uma maneira diferente, deixando de lado idéias antigas, que atribuíam o excesso de gordura a uma falta de força de vontade da pessoa, além de acreditar que somente fatores ambientais, como a alimentação em excesso e o sedentarismo desencadeariam o problema. A nova concepção mostra que a herança genética realmente exerce uma influência significativa no surgimento da obesidade. Em virtude disso, avançam os estudos de mais de 30 genes que poderiam ter uma possível contribuição na obesidade humana.
Deduz-se daí que talvez não esteja tão distante o dia em que será possível tratar com mais eficiência esta tão enigmática e mal conceituada enfermidade.
Fontes: Revista Up to Date.
 Matéria escrita por Dr Alex Valenzuela Montero. (Vice Presidente da Sociedade Chilena de Obesidade; autor do livro: Obesidade; Membro da FLASO – Federação Latino americana de Sociedades de Obesidade; Membro da IASO – Inaternational association for Study of Obesity)





Nenhum comentário:

Postar um comentário